O que de fato a poesia, a
arte, a música, tem a ver com a psicanálise?
Olho para dois
pontos interessantes. A expressão e a reparação.
Freud, médico neurologista,
fundou a psicanálise na década de 1890 a partir de relatos de alguns de seus
pacientes com problemas neurais, percebeu que alguns sintomas não tinham ordem
orgânica e sim eram de ordem emocional, porém os sintomas estavam lá. Criou
então uma técnica como instrumento de trabalho, a Associação Livre, onde pedia
para seus pacientes falarem o que lhe vinham na cabeça.
Nesta época, a repressão e a
falta de expressão eram muito mais severas do que hoje em dia, visto que os
sintomas dos pacientes tinham características mais graves do que se encontra
hoje normalmente.
A histeria antiga
apresentava sintomas como paralisação de partes do corpo, desmaios súbitos,
anestesias, etc.... Estes sintomas foram se transformando num grau menor, mas
ainda intenso na ansiedade atual, onde a
grande maioria dos casos são sintomas menos severos, mas alguns intensos ainda.
Existem mais de 100 sintomas que podem caracterizar a ansiedade e todos são
correlacionados com o momento da vida que a pessoa pode estar vivendo ou viveu.
Os sintomas físicos de ansiedade
mais comum hoje são palpitação, formigamentos, espasmos musculares, tonturas,
falta de concentração, falta de ar, dores de estomago, tensão muscular,
dificuldade para dormir.
Enfim, somos seres que
necessitam de expressão e reparação em alguns momentos da vida. Desde muito
cedo começamos a nos expressar com choros e brincadeiras, quando adulto, vamos
nos estruturando, criando nossas defesas, nossas forças, crenças, modo de viver
e ver a vida. Mas a vida não é o tempo todo um mar de rosas.
A visão antiga de ter saúde se
denominava em estar bem em todas as áreas da vida, corpo, mente e espírito. Mas
é uma ideia totalmente idealizada, hoje se sabe que a saúde, pode muito bem
aparecer em momentos difíceis mas onde a pessoa mesmo em crise não se abandona e
enfrenta as dificuldades e desafios quando a vida pede.
É em momentos assim, onde a
dificuldade aparece que a palavra pode surtir um efeito, não apenas neste
momento. Quantas vezes você não estava bem, teve um dia ruim, e lê algo que faz
todo sentido? Então vem uma leve sensação de alívio momentâneo, podendo ser o começo consciente ou inconscientemente para ir se estruturando novamente.
Além da poesia, a música,
filmes e a arte em geral apresentam esta função, de criar sentido onde estava
bagunçado.
Ao colocar as emoções nas
palavras estaríamos criando vazão à energia que existe dentro de nós e
reconstruindo o que pode estar um pouco desintegrado ou mesmo sem percepção
consciente.
Existe uma sutil
reunião entre a obra, o artista e o leitor. Nesta reunião se instala o que o
artista sentiu quando fez a obra, que pode ser diferente da interpretação do
leitor, pois ele tem suas próprias convicções e sentimentos e por fim a obra,
fazendo a ligação entre os dois mundos, do artista e do leitor. A obra só
existe quando ela se desprende do artista e entra na vida do leitor criando seu
próprio sentido.
“ O artista não é a sua
obra. Não é ele que esta ali. Se a obra não se desprende daquele que a fez, ela
perde o valor de obra, vira apenas sintoma. A obra se refaz cada vez que um
olhar se põe a olhá-lá. Assim, não esta nem no suporte onde foi feita nem
naquele que olha. Ela se dá entre o que olha e o que é olhado.”
(Glaucia Nagem)
(Glaucia Nagem)
Da mesma forma que o artista
cria a sua obra em forma de se expressar devido à uma necessidade de reparação,
o leitor tem ao seu dispor palavras sentidas por alguém com desejos existentes
na inconsciência de todos nós.
Já dizia o psicanalista Winnicott, é no brincar, e somente no brincar, que o individuo, criança ou adulto, pode
ser criativo e utilizar sua personalidade integral; e somente sendo criativo
que o individuo descobre o seu eu verdadeiro.
“E não seria o espaço
analítico um ambiente propício para que este brincar criativo pudesse ocorrer e
novos ensaios para a vida pudessem se desenvolver? E o que faz o poeta, senão
brincar com as palavras? As palavras com os blocos simples de construção, que
ao sabor de cada um vão juntando para construir algo novo.”
(Jussara S. Dalzot)
(Jussara S. Dalzot)
Finalizo com um poema lindo.
“Dói. A vida dói.
Viver não é isento de dor.
O tempo passa, a vida se
Desenvolve, a folha
amadurece
E depois, cai
Mas outra folha vem. Há
renovação,
Há vida, há amor, há
encontro.
Onde a verdade? Dentro de
ti,
Dentro de mim, na
intersecção
Invisível do nosso sentir.”
(Jussara S. Dalzot)
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